21 de junho de 2011

Fazendo o rancho no Irã

Sabe aqueles mercadinhos e banquinhas de frutas que existiam antigamente aos montes no Brasil? Pois aqui no Irã ainda é a forma mais popular de se fazer compras. Em cada bairro há dezenas deles e todo bom iraniano possui o seu carrinho de compras com rodinhas para fazer as suas comprinhas. Eu comprei o meu para poder carregar melões, melancias e pêssegos pelas ruas e me inserir no cotidiano local.

Carrinho de compras "típico".
Mercadinho na rua de baixo da minha casa.


Claro que há supermercados também. Inclusive, o mais famoso deles de nome Hyperstar (inaugurado em 2009), é a cópia fiel do Carrefour. Dizem que iria abrir como Carrefour, mas depois das sanções, acharam por bem mudar o nome. Mas tudo isso pode ser só intriga da oposição, já que há Hyperstar no Paquistão também. Seja como for, as 2 marcas se parecem demais, bem como o ambiente interno do supermercado.





Hyperstar Iran: setor de frutas.
Foto do Facebook do Hypertar.

Hyperstar Iran: setor da Nestlé.
Foto do Facebook do Hypertar.

Hyperstar Iran: setor de sorvetes!
Foto do Facebook do Hypertar.


Felizmente os mercados estão bem supridos de produtos locais e importados. A maior parte deles de fabricação iraniana também dispõe de explicação em inglês. UFA! Os produtos de limpeza são os menos adaptados para estrangeiros e muitas vezes nem uma única palavra está escrita em um alfabeto decifrável. O jeito é escolher apenas os que têm alguma explicação em inglês, nem que seja uma única frase do tipo "multi purpose cleaner" anexo de uma foto com uma cozinha brilhante. E aí, neste caso, esqueça as inúmeras explicações que constam no verso da embalagem, todas escritas em farsi.

Um elemento óbvio e de fabricação apenas local é sal. Não faria sentido para o Irã importar tal coisa, tendo o mar cáspio e o golfo Pérsico como fronteira. Assim, só encontrei embalagens escritas em farsi e confiei que uma delas seria sal por ter um tamanho e volume "adequado" para o consumível, bem como contava com um desenho de uma "sorridente cebola" fazendo sinal de "ok" na capa (que para o Rafa é um saleiro). Acertei: em casa constatei que era sal mesmo! Na próxima compra já faço um estoque.
Lembrei muito de um amigo nosso, Luciano, que morou no Japão e passou por isso. Contava ele que quando via um ursinho fofinho na embalagem, já sabia que se tratava de amaciante...

Nem preciso dizer que o primeiro rancho da casa demorou algumas horas nesta diversão de conhecer e decifrar embalagens. Alguns produtos são velhos conhecidos (tipo sopa em pacote ou caldo de galinha das famosas marcas), mas só a marca está escrita da forma que você conhece: todas as instruções estão em farsi. Coloque então sua memória para funcionar ou pesquise na internet o modo de preparo. ;-)

Alimentos. Marcas iranianas e internacionais. mas de fabricação local.

Material de limpeza.

Produtos importados.

17 de junho de 2011

Dia 12 de junho não é dia dos namorados no Irã



Fui encontrar com meus amigos iranianos e achei estranho encontrar uma das mulheres toda vestida de preto. Não que preto seja algo pouco usual no Irã, muito pelo contrário, mas há muitas pessoas que evitam esta cor. Preto por aqui não emagrace e sim entristece de tanta gente que usa.
Então, papo vai, papo vem, uma das colegas perguntou o motivo do uso do preto... "A de preto", de forma vaga e um pouco cínica, respondeu-nos que perdeu algo muito importante 2 anos atrás no dia 12 de junho...

Precisei da ajuda dos universitários para matar a charada: 2 anos atrás foi a re-eleição do atual presidente. Então fui advertida para evitar circular na Vanak Square, uma área de fácil alcance de onde moro e onde normalmente as pessoas se reúnem para protestar. Explicaram-me que os protestos são geralmente do tipo sem violência e mudos (ninguém fala nada). E dia 12 de junho seria muito provável de acontecer algo. Claro que já sabendo disso o policiamento também aumentou na data e pelo que eu saiba os poucos protestos que se iniciaram foram rapidamente dispersados pela guarda.

Aqui o movimento oposicionista é chamado "movimento verde". Já sabendo disso, evitei a compra de roupas com esta cor para trazer para o Irã...
Confesso que deu uma curiosidade de ir lá na Vanak no dia 12 e ver se iria acontecer alguma coisa, mas achei prudente esquecer e comemorar a data pelo seu significado brasileiro.

No encontro seguinte todos se perguntavam se "tinham ido fazer compras" no dia 12... A Vanak é também um centro comercial, o que justifica a passagem por lá para umas "comprinhas"...


Para saber mais:
http://www.insideiran.org/media-analysis/green-movement-holds-silent-protest-urges-more-demonstrations/

http://wagingnonviolence.org/2009/06/dont-give-up-on-nonviolence-in-iran/

PS: cabe destacar que na noite de véspera do dia 12, também se ouviam gritos das janelas dos apartamentos com frases do tipo "Deus é grande" (em farsi, óbvio!) e outras do gênero. Naturalmente os manifestantes gritam ocultos na escuridão. Esclareço ainda que esta particular frase foi lema da revolução de 1979 e tem sido usada nos dias atuais.

11 de junho de 2011

Darband - gastronomia e trilhas a 2 mil metros de altura

Darband fica numa região no norte de Teerã, ideal para um dia de lazer e felizmente pertinho de minha casa.
Chega-se lá por uma única estrada de mesmo nome, que vira uma ruela, que então vira uma escadaria para finalmente tornar-se uma trilha nas montanhas. Este trajeto é feito ao lado de um rio que depois se torna uma bela cachoeira subindo a trilha. A grande peculiaridade de Darband são as dezenas, ou talvez centenas de restaurantes e casas de chás que ficam encravados na montanha e às vezes até mesmo dentro do rio. Alguns restaurantes colocam tablados de madeira com tapetes por cima do rio, criando um clima "refrigerado" para seus clientes, especialmente agradável na estação de verão. Outros pegam mangueiras e borrifam água no entorno de suas casas de chás criando uma nuvem úmida. Tapetes persas e luminárias não faltam no local.

Início da trilha
Tablados de madeira com tapetes persas para os clientes dos restaurantes sentarem e desfrutarem.

Ontem saímos de casa após o café da manhã reforçado para fazer a trilha. Conosco apenas um boné, celular e dinheiro no bolso. Nem levamos mochila com mantimentos, afinal por toda a trilha, mesmo nos lugares mais altos, é possível encontrar alguém vendendo água, pepsi e cerveja sem álcool. O público de Darband é heterogêneo: desde moças com saltos altíssimos e super maquiadas - prontas para a paquera -, a mochileiros muito bem paramentados com seus bastões de trekking e roupas tecnológicas.

Eu fui de calça de trilha, camiseta dry-fit manga comprida, e tênis salomon. Como "acabamento", para adaptar-me à moda islâmica obrigatória, coloquei por cima uma camisa comprida tapando as nádegas e um lenço na cabeça. O lenço dá um grande desconforto térmico ao fazer esportes, mas a medida que avançávamos na trilha de Darband e nos afastávamos da "muvuca" de pessoas nos restaurantes pude perceber que as mulheres desfilavam mais livres de suas obrigações de vestuário: os lenços foram substituídos por bonés com proteções no pescoço ou mesmo por um simples boné com a aba virada para trás. Vez ou outra encontrava uma moça sem nada na cabeça descansando em um canto com amigos. Em outras ocasiões mais raras via mulheres de chador (pretinho básico completo da cabeça aos pés) e tamancos/ sandálias nada práticas para a trilha pedregosa. E eu, com o meu tênis poderoso, perguntava-me como estas mulheres conseguiam se equilibrar pelo caminho. Vale lembrar que um chador não tem botão ou zíper e para mantê-lo fechado deve-se usar as mãos por dentro do tecido. (para saber mais sobre CHADOR, veja as postagens de 2010 com o vídeo de como vestir um chador e a de conceitos da moda islâmica, ou ainda na wikipédia).


Já com a camisa amarrada na cintura e sem véu.

Faltando pouco para o ápice da trilha, dei uma "amarelada" e não quis prosseguir já que minhas pernas não estavam respondendo adequadamente e o fato de ter que continuar numa espécie de trilha/ escalada com um precipício ao lado não me animou muito. Vale destacar que nesta altura da trilha passamos por um "alojamento resgate" com um grande cartaz exibindo fotos de pessoas horrivelmente acidentadas na trilha. Nada estimulante... O Rafael, que possui falta de genes relativos à racionalidade vinculados à auto-preservação do seu "eu" [o que esperar afinal de um EX-(paraquedista, alpinista, esqueitista, surfista, etc, etc)?!], não hesitou em prosseguir enquanto eu aguardava em um local mais seguro ao lado de uma banquinha improvisada de refrescos. Pena que, sem ter considerado este fato, o dinheiro ficou no bolso da calça do Rafael... :-P
OK então: uma hora de espera sem nada para beber. Pelo menos ganhei uma bala de um dos trilheiros que por ali passou (achei que já estava grandinha para aceitar balas de estranhos).

Advertência quanto à acidentes nas montanhas. Sinistro!



Mais aliviada pela decisão tomada: daqui eu não passo!


Ponto de desistência/ início da "escalaminhada".

Vista da etapa final da trilha. Desisti na metade do que aparece nesta foto.

Avisos em farsi. Só entendi a altitude e as caveiras.

Alojamento no alto da montanha (foto tirada pelo Rafael). Considerando agora que os caras levaram todos estes tijolos até lá, devo reavaliar o grau de risco da trilha para uma próxima vez.


No total, são mais de 1000 metros de altitude entre o início da trilha e o ápice de um dos picos da cadeia de montanhas. No alto há um pequeno restaurante e alojamento, e de lá é possível prosseguir por outra trilha para alcançar o teleférico de Tochal (onde há uma estação de esqui). Acho que em uma próxima vez, mais preparada psicologicamente e não tendo que retornar pela mesma trilha, prosseguiremos por esta rota.

A descida da trilha requer, se os têm, bastões de trekking para poupar os joelhos. Além das pedras, alguns trechos estão molhados e são bastante escorregadios. No entanto, a certeza de uma parada em um dos agradáveis restaurantes para desfrutar da gastronomia local ajuda na motivação. Prato principal: naturalmente um kebab com arroz. Incrementamos a opção pedindo uma "badendjam" (beringela) refogada com lentilha/ cebola/ etc e petiscos de azeitonas com pasta de castanhas. Adoro!

Badandjam com iogurte por cima (para comer com pão ou arroz).

Arroz, pão (em baixo do prato de arroz), kebab, folhas de um tipo de manjericão mentolado, salada e azeitonas com pasta de castanhas.


É praxe no Irã tomar chá. Quando você o pede, é certo que virá com tâmaras e um pirulito de açúcar. Este normalmente é colocado na xícara para adocicar o chá ou mesmo para amolecê-lo e ser então mordiscado. Fica a critério do freguês. Deixá-lo de lado também é permitido. ;-)

Chá, pirulitos e tâmaras.

Rafael pediu um narguilé no final "só para relaxar" da trilha.
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